A hora estática
O teu olhar metálico subverte cada
parapeito das janelas. Estás voltado
para as coisas -
o teu olhar
é essa página
em branco de onde se avista a mão
luminosa a vadiar como
sombras num vitral de igreja -
nenhum
reflexo
na estrada. O teu olhar metálico está
prestes a sentar-se
à secretária no ponto exacto de sol,
que a
oriente cativa
o sonho. A porta abre-se sem que
te desperte e entram estranhas
personagens para a boca de cena -
personagens com cábulas na mão.
E a luminosidade cessa, projectores
concentram-se em cada discurso
sem nexo - as síncopas
bruscas estimulam a escala cromática
bruscas estimulam a escala cromática
de sensações.
A porta bate aflitivamente,
o vento acontece ao sol, trespassas
a página branca, as vozes, as luzes,
os corpos em monólogo, trocas
cada objecto
sem jamais lhe tocares e resgatas
o teu recanto à secretária de onde
te vejo permanecer imagem de ti
mesmo - amores e ciências,
o horizonte para onde concorre
nostálgico o olhar e cada
horizonte - os teus olhos que veem
sempre além da linha
que separa a luz da sombra. A noite,
já muito antes era noite. A chave
tinhas selado a porta, exilado
arcaico e silenciando a mente para
arcaico e silenciando a mente para
melhor consigo se encontrar. Ainda
a memória de outro tempo quando
deixavas a mesma porta navegar
a desordem dos sentidos
a embarcar até ao horizonte
dos navios. Há pouco, nessa hora
soletradamente estática, vejo-te
consomes a hora, peças da insónia
que fabricas com a dor que não é dor,
houvesse antes a dor e sendo odor te
enlodasse à terra. Aqui. Onde te vejo
cego a questionar a fórmula que vai
de ti até ao horizonte: moeda que
em volta de si dança,
a cara a perseguir
a coroa, valsas de baile entre
infinitos, sem nunca se tocarem
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