Passagem
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A mulher aplana a silhueta na janela.
Soltam-se pedras,
uma estátua imortal, um pedaço de vento
uma estátua imortal, um pedaço de vento
em memória,
transporte para a tempestade, é essa face
transporte para a tempestade, é essa face
que olha
os prédios que reflectem os olhos -
os prédios que reflectem os olhos -
essa matéria sólida.
A mulher não sabe, olha simplesmente
A mulher não sabe, olha simplesmente
o que nunca
voltará a olhar – a estrada oblíqua de
voltará a olhar – a estrada oblíqua de
inaudíveis
passos.
A mulher com olhos fechados sussurra: –
A mulher com olhos fechados sussurra: –
Não tenhas
medo -
medo -
se abrires os olhos com o primeiro vento
da manhã - a tua face beijará
da manhã - a tua face beijará
o cabo do desejo.
A boca traça um fino ornato do seu acto,
A boca traça um fino ornato do seu acto,
com avidez
o pincel inflige tinta num extenso
o pincel inflige tinta num extenso
pergaminho do retrato.
Permanecer é a doce tortura do amor,
Permanecer é a doce tortura do amor,
suspender
o juízo
que vê de fora. A mulher revê-se
que vê de fora. A mulher revê-se
na beleza dessa figura,
o perfil que fustiga a carne, a imagem -
o perfil que fustiga a carne, a imagem -
apenas imagem.
A pele crua trabalha o amor à distância
A pele crua trabalha o amor à distância
dos ramos e das
sortes, a essência das árvores que
sortes, a essência das árvores que
pontificam os lugares
em que pressente numa
carga volátil -
os dedos da terra.
Terrestre é a voz das encruzilhadas, -
Terrestre é a voz das encruzilhadas, -
as árvores atrasam a súbita luz que olha
inteira
a passagem dos olhos.
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