Recado anónimo


© Jean Dieuzaide



            Pela mão que augura a noite, vem 
um recado anónimo. Há luzes que tecem 

 um lavrado efémero na terra, e transmito
    as luzes, - a mão enche-se pouco a pouco de 

pequenos coisas

que afagam máscaras de cena. Há faróis acesos 
em desvio de
 de estrada, e a roda frágil de um carro caminha
para a morte,
  num longo travelling atravessa os corpos antes 
de amanhecer

o vento. Cruzo um labirinto com os dedos 
              e afago com moleza
a teia, o canto do cisne é o silvo da serpente, - 
                    estertor de um
  pássaro em calor de tarde. Vem, não venhas - 
há bilhetes que

      se deixam na noite e depois esse gesto 
por tudo 
o que não foi
e ainda a morte, essa invenção do homem 
que aprisiona em datas

as estações: anónimo presságio e testemunho 
que facilmente apago,
  na curva da paisagem construo o paradigma

do desejo; nesse ponto vago e impreciso, 
dou-te os pensamentos
 para brincar à cabra cega, à leitura do borrão 
de tinta - vem,

   não venhas, regressa pela memória, escreve 
a noite que conduz
                  até às sete portas antediluvianas: - 

as sete chaves que rasgam

a manhã. Para ti o olhar que não se vê - 
pressentimentos, o fim

  do luga, a atemporalidade dos espaços, 
a longa jornada para

a dor de abrir portas em surdina: 
a fonteira que cumpre o ritual
de iniciação às constelações que, 
                  entre si, 
               disputam a distância




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