Universus


© Jerry Uelsmann



A câmara é o olho do universo - 
respiro aquele intérprete
cansado, na medida da expectativa 
dos braços e das pernas,
ainda suspensos nos degraus aéreos 

dos jardins de infâncias

que sobem, e caem em escada sem pisar 
as árvores, o bosque
que viaja o universo cavalgando 

a tela esquecida a um canto 

do sotão labiríntico da terra. 
Qualquer olhar é um microscópio
de monstruosas formas -  
a brisa suave dispersa-se na mão

de um arquitecto das estrelas 
- um gesto 
brusco da criança
que extingue um desenho solar 
a solução final é o silêncio

do sol. A câmara alheia-se nesta convulsão, 
película, bobinas
escavam o cérebro - 
desespero de não haver princípio & fim.

Em plano médio aproximado descrevo-me, 
invado a câmara,
faço o gesto da noite - 
o sol persiste gasto na linha da mão.

Ao adormecer, tracei previamente 
um círculo na terra, estou
no centro e o mundo é uma bola 

lançada à infância para que
imagens joguem entre elas o jogo 
sem regras enquanto olho

a construção das casas. Num bolso fica 
o segredo, a fórmula
de que nada é morto ou vai morrendo 
em seu lugar. A calma

aparente aceita a sorte e perfuro o sonho, 
a música, o tédio entulhado em beatas 
de cigarros os estilhaços de uma nova

ordem. Essa câmara persistia enquanto olhar 
de mim sobre
mim mesmo, sortilégio tardio de Verão 
no velho ecrã de uma
sala de cinema mudo onde um piano tocava 

nostálgico. Ainda. Houve um momento – 
é certo: um só momento entre outros,

único e efémero. A mão tombou. 
Após ter desligado a câmara.




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