Zénite


© Ralph Gibson



     No início era o nada. Aí ser e pensar não habitava, 
e tal como todos somos o nada, - o eterno, 
        o finito, cada tempo, e o espaço:
o nada inteiro completa-se 
         em toda parte - relativo a cada lugar.

    Seguro é o que é mutável, aquilo que tudo derruba
         e cria a partirdo nada - não é o pensamento que 

faz o homem. Na tua alma há
o ser por fazer: - sê único, e a plenitude, e o nada 
                   a ti pertencem.

Acima de Deus, há outro deus:
            a possibilidade improvável, 
            a realidade ilusória, a vida, e a morte,

o verdadeiro e o falso, 
a luz e as trevas, o bem e o mal - gémeos

na mesma sentença e mesmo acto - 

esse é o amor que rasga
  o amor. Um sacro, outro traidor, ambos 
                   o hermafrodita pioneiro.

          Criatura mais temerosa não existe, 
esse é o amor do homem,
o alfabeto do homem - 
as duas divindades que se negam: 
          o amor e a morte 
que se negam. E sem limite

   é a classe dos deuses pois toda a estrela é 
  um deus, e cada estrela
se faz homem: - todo o acto que fizeres aos 

deuses, a ti será feito.

No longo intervalo do zénite do céu -
                          solitária oscila cada estrela
.
Esse é o único deus do homem, e de que os mundos
se alimentam. Esse é o homem supremo, aquele que 
 com a mão acende e apaga as suas amplas moradas - 

   e a esse último deus, o homem dará as suas preces
preces que avivaram a luz da estrela. 

                      Ainda que o mais vasto esfrie

a estrela abrasa e para isso é feita a a estrela.
    Entre o homem e o seu mesmo deus não há outro
                               poder que seja.



Copyright © Luísa Vinuesa. Todos os Direitos Reservados  




Recriação poética de Sete Sermões aos Mortos de C. G. Jung, integrado em 
Memórias, Sonhos, Reflexões, ed. 2006. (NdA)