Edna St. Vincent Millay


A UM JOVEM POETA


O tempo não pode separar o pássaro de sua asa.
Pássaro e asa juntos
Caem, numa só plumagem.

Nenhuma coisa que já voou,
Nem a cotovia, nem tu,
Pode como outros morrer.



MULHER-BRUXA


Ela não é rosada nem pálida,
     E nunca será inteiramente minha;
Aprendeu as suas mãos num conto de fadas,
     E a sua boca num dia de são valentim.

Ela tem mais cabelo do que necessita;
     Ao sol é uma aflição para mim!
E a sua voz é um colar de contas coloridas,
     Ou degraus que levam ao mar.

Ela ama-me em tudo o que pode,
     E a seus caminhos por meus renuncia;
Mas não foi feita para qualquer homem,
     E nunca será inteiramente minha.



O FILÓSOFO


Quem és tu, se por te desejar
      Deveria manter-me acordada
Tantas as noites como os dias
      Chorando por tua causa?

Quem és tu, se por sentir a tua falta,
      Quantos dias deveria rastejar
Deveria permanecer a ouvir o vento
      E a olhar para a parede?

Conheço um homem, mais corajoso
      E vinte homens tão gentis,
Quem és tu, que deverias ser
      O único homem em minha mente?

Mas se os modos das mulheres são tolos,
      Como qualquer sábio dirá, -
Quem sou eu, que deveria amar
      Tão bem e sabiamente?



EU, QUE NASCI MULHER E INQUIETA


Eu, que nasci mulher e inquieta 
Por todas as necessidades e noções da minha espécie,
Sou instada pela tua proximidade a considerar
A tua pessoa honesta e a sentir um certo entusiasmo
Em suportar o peso do teu corpo sobre o meu peito:
Tão subtilmente é desenhada a cortina da vida,
Para acelerar o pulso e obscurecer a mente,
E me deixar uma vez mais perdida, possuída.
Não penses nisso, porém, a pobre traição
Do meu sangue forte contra o meu cérebro vacilante,
Vou recordar-te com amor, ou ocasionalmente
Com desprezo piedoso - deixa-me esclarecer:
Penso que este frenesim é motivo insuficiente
Para conversar quando de novo nos virmos.



OBJECTOR DE CONSCIÊNCIA


Morrerei, mas isso é tudo o que farei pela Morte.

Ouço-a conduzindo o seu cavalo para fora do estábulo; ouço o barulho no chão do celeiro.
Está com pressa;  tem negócios em Cuba, negócios nos Balcãs, muitos telefonemas para
       fazer esta manhã.
Mas segurarei o freio enquanto aperta a cilha.
E pode montar sozinha: não a ajudarei.

Embora bata em meus ombros com seu chicote, não lhe direi para que lado a
       raposa correu.
Com o casco no peito, não contarei onde o crioulo se esconde no
       pântano.
Morrerei, mas isso é tudo que farei pela Morte;   não estou em sua folha de pagamento.

Não lhe direi o paradeiro de meus amigos nem de meus inimigos.
Embora muito me prometa, não mapearei a rota para a porta de ninguém.

Serei um espião na terra dos vivos, para entregar os homens à morte?
Irmão, a senha e os planos de nossa cidade estão seguros comigo; nunca
       através de mim
Serás vencido.



O VEADO NA NEVE


Céu branco, sobre as cicutas curvadas pela neve,
Será que viste no início da noite o veado com chifres e a sua corça
Parados no pomar de macieiras? Eu vi-os. Vi-os de súbito,
As caudas erguidas, encantadores e lentos saltando alto,
Sobre a parede de pedra na floresta de cicutas curvadas na neve.

Agora ele aqui jaz, o seu sangue selvagem escaldando a neve.

Estranha coisa é a morte, trazendo de joelhos, e pelos chifres
O veado na neve.
Esteanha coisa é a morte - a uma milha de distância, talvez,
Sob as cicutas pesadas que com a passagem das horas 
Se fazem mais leves, deixando cair uma plumagem de neve...
A vida, que olha atenta dos olhos da corça.




Edna St. Vincent Millay in Edna St. Vincent Millay Selected Poems
J. D. McClatchy, American Poets Project,The Library of America, 2003.
Versão Portuguesa de Luísa Vinuesa.

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