Alejandra Pizarnik

 

I


OS TRABALHOS E AS NOITES


para reconhecer na sede o meu emblema

para concretizar o meu único sonho

para nunca mais voltar a sustentar-me no amor

fui toda oferenda


um puro errar

de loba no bosque

na noite dos corpos


para dizer a palavra inocente



II


VERDE PARAÍSO



estranha que fui

quando vizinha de longínquas luzes

acumulava palavras tão puras

para criar novos silêncios



III


UM ABANDONO


Um abandono em suspenso.

Ninguém é visível sobre a terra.

Apenas a música do sangue

assegura residência

num lugar tão aberto.



DO OUTRO LADO


Anos e minutos fazem amor.

Máscaras verdes debaixo da chuva.

Igreja de vitrais obscenos.

Mancha azul na parede.

Não conheço.

Não reconheço.

Escuro. Silêncio.




Alejandra Pizarnik in Os Trabalhos e as Noites (1965), ed. 2013.

Tradução de Diogo Vaz Pinto.