Harold Norse
deus abençoe a amérlca - e lorca
Leitura de Lorca em sala pública -
A sua revolta fundamentada contra a razão como pendor social,
Recusando a sindicalização da poesia:
Rejeitando o décolletage surrealista e o Selo de aprovação do grupo:
procurando o orgânico
Numa era de emoção inorgânica
:Tenho pena do homem que está à minha direita, olhos míopes a cinco centímetros de Vida
E daquele com o bigode de aço
E do Guia de Actividades ao Ar Livre: e do adolescente glandular
Com os movimentos incertos e o olhar erótico vesgo
De confusão: que de repente: dos seus mundos divergentes E obsessões
que se entrechocam: como nadadores, todos se erguem Por um momento: cabeças submarinas:
captaram ondas Sonoras da rua do comércio e bandeiras a ondular
Kate Smith cantando "Deus Abençoe a América".
cena de rua
Por orientação desleixada ou crescimento, esses adolescentes que se agarram às sombras
nos degraus da central estão mortos.
O seu riso entrecortado, distorcido pelo que entendem mal, entristece
a aparência da rua abandonada como o seu futuro.
E todos os planos cívicos e parques e parques infantis arborizados são um suicídio insultuoso
para esses rostos já culpados.
Que (sinalizados pelos meus calcanhares) como astutos elfos do mal se erguem dos seus rudes
abraços gotejando censuras obscenas.
magnificat
Et esultavit... não, Johann Sebastian, não no fraco magnificat que (doentiamente)
tecemos, uma pequena bandeira do nosso louvor. Isto não é para nós. Suscepit Israel ...
Recebeu-nos, ó, com cruel misericórdia na noite, como ladrões, como leões caídos.
A nossa exultação não é livre.
Mas presos como Prometeu à rocha,
o nosso fígado devorado pelo abutre de Deus,
vimo-lo derrubar os humildes, exaltar os poderosos
- Abraão agrilhoado à rocha, coberto de lama.
Ó Pai Abraão, o Espírito Santo, o teu louvor, a tua glória, olha! olha para a
semente do pai, os lombos ressequidos e o credo de absinto!
Não recomendaria o amor
A minha cabeça parecia esfaqueada
por uma coroa de espinhos, mas brincava e andava de metro e escondia-me
nas casas de banho da escola para me masturbar e escrevia secretamente
sobre o inferno da adolescência porque eu era "diferente", o primeiro e o último da minha espécie
sufocando sensações agudas em piscinas e balneários, viciado em
lábios e genitais, louco por nádegas
que Whitman e Lorca e Catulo e Marlowe
e Miguel Ângelo
e Sócrates admiravam
e escrevi: Amigos, se desejam sobreviver, não recomendaria o Amor
peço aos invisíveis
Peço aos invisíveis Que guiam os nossos pensamentos pelos seus Que transportam as nossas
vidas através das terras da morte – Anjos & sábios & agentes celestes -
Peço o matrimónio do sol C? a lua No meu duplo-canceroso horóscopo
Coragem para me retirar do poço Onde as forças solares não podem entrar
Que Pã pare de turvar os meus riachos límpidos - deuses Antigos devem ser trancados
—
E que o altar magnético Com incenso purifique o ar
E que não haja bestas lunares Dançando nos meus bosques
Harold Norse, In the Hub of Fiery Force: Collected Poems 1934-2033, Thunder’s Mouth, 2003.
Versão Portuguesa © Luísa Vinuesa